Barro até nas paredes

         

Ateliê Entorno 2023

        Em 2019, quando já estávamos construindo a casa onde hoje fica o ateliê, eu sonhava com tudo que poderia fazer com tanto espaço que teríamos. Uma das ideias que não me saía da cabeça, era a de fazer a nossa própria massa cerâmica, com características estéticas e funcionais que eu buscava mas não encontrava nas massas disponíveis até então.

Procurei pelo mestre Narciso e ele me ofereceu uma consultoria, onde me ensinaria em encontros semanais tudo o que eu precisava saber para formular minha própria massa.

O ateliê do Narciso fica em Quatro Barras, município vizinho de Curitiba, na antiga estrada da Graciosa. Para chegar lá, pegava a Régis Bittencourt e na entrada para Campina Grande do Sul, caminhava para o lado oposto. 

Foi depois de passar diversas vezes por esse caminho que avistei um barranco de terra vermelha numa bifurcação da estrada.

Um parênteses aqui, para dizer que tenho uma conexão grande com a terra vermelha pois, apesar de ter nascido em Curitiba, minha família veio do norte do Paraná, onde passei praticamente todas as férias e feriados da minha infância. Lembro de que quanto mais ao norte viajávamos, mais vermelha era a paisagem. E nas cidades, a base das casas chegava a ter um degradê avermelhado.

Naquela época (voltamos a 2019), a única pessoa que trabalhava comigo na Entorno era Cauê, a quem contei sobre o barranco e convidei para esse passeio com pás e baldes a fim de checar a qualidade daquela terra.

Coletamos um tanto suficiente para fazer um teste e ela era tão perfeitamente laranjada que pensei que teria de servir para algo. Para colorir nossa massa, para formular um engobe, quem sabe até para testar um vidrado. 


O primeiro teste

Mas logo misturando ela apenas com água, ela se mostrou a cor e a textura lindas. De início, havia idealizado a casa toda branca e cinza, bastante minimalista, com um ar de barracão, mas com essa tinta tão perfeita não conseguiria evitar por uma cor nela..

Começamos a fazer os testes do que poderia segurar essa tinta na nossa parede, pois sabia que apenas água e terra, na primeira chuva, teríamos toda nossa cor no chão. Li na internet várias dicas, de usar albumina, trigo, ovo e outros materiais industriais como impermeabilizantes e produtos que já nem me lembro.

O nosso grande campeão foi a cola branca. Um material incolor, adesivo e que poderíamos usar em uma quantidade mínima (um pote de 500g foi suficiente para pintar a parede frontal externa, uma parede da loja e duas paredes da cozinha).

Para preparar a tinta, deixamos a terra secar, peneiramos numa peneira grossa só para tirar impurezas, hidratamos com água até ficar numa textura de tinta e adicionamos a cola. Tudo misturado com um pedaço de madeira.


Peneirando a terra

Para aplicar, começamos pela parede externa, onde duas demãos foram suficientes. Deixamos chover para ver se resistiria e então, convidamos amigos para pintar a parte interna.


Eu, Cauê, Luana e Aninha pintando a cozinha

Pode parecer bobo, mas para mim, os objetos precisam fazer sentido para continuarem existindo. Poderia ter atravessado a rua e comprado a mesma cor de tinta pronta, por um valor provavelmente parecido e sem tanto trabalho, mas acredito que a beleza das coisas está na história, no movimento e nas pessoas que as cercam.


A fachada e as paredes da loja e da cozinha logo após a pintura


        Na lateral da casa ainda fizemos a pintura em triângulo para dar um melhor acabamento sem precisar pintar a casa toda. Não encontrei foto dessa lateral para ilustrar mas quando você vier, dá uma olhada =)


Decidi escrever sobre isso hoje, pois percebi que precisamos de uns retoques e estou me preparando para voltar lá naquele barranco buscar um tanto de terra novamente. 




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